"Um artista tem de tocar o coração senão não é arte"
“Eu abri a geladeira e só tinha uma cenoura e um tubo de cola... Como não podia comer a cola, devorei a cenoura e, em meio às lágrimas, jurei que nunca mais passaria por aquilo de novo!”, este foi o momento em que a artista plástica Biba Rigo – nascida Nilva dos Santos Rigo – decidiu que sua vida seria transformada completamente. Associada da BSGI desde 1995, Biba encontrou na filosofia humanística do Budismo Nitiren a resposta a muitas das diversas questões que a afligiam na época. “Eu vivia em um mundo muito vazio, superficial, calcado nas aparências”, conta.
Nessa época, sua arte começava a despontar no mundo da moda e do design. Um mundo de glamour e celebridade, mas que não lhe trazia qualquer realização. “As pessoas não tinham conteúdo, era tudo muito fake (falso)”, explica.
Um grande amigo a iniciou. “A filosofia me deu prumo!”, exclama. Decidiu largar tudo e retornar às suas raízes mais ancestrais. Tomou sua filha Tarsila nos braços, na época uma menina, e mudou-se para a cidade de Fartura, no interior paulista. Voltou-se à terra e à contemplação, com o intuito de “domar todo aquele turbilhão” que a inquietava. Dedicando-se com afinco à filosofia que decidira abraçar, foi experimentando, cada dia um pouco, buscando encontrar sua arte e um sentido para ela.
Pouca gente acreditava que era possível desenvolver algum projeto artístico ali. “Diziam: ‘mas você quer fazer arte aqui?!?!?! Aqui não dá nada!’. E eu pensava: ‘mas é por isso mesmo!’. E fiz”, relembra. Pintou muros, objetos do cotidiano como placas indicativas, regadores, vasos. Pintou fachadas de casas, pintou o sete. E o oito. E mil outras coisas.
Até que o prefeito a desafiou a criar um projeto. Veio o Arte nas Férias que acontece até hoje, mesmo estando a idealizadora longe, na capital. “A arte cria raízes e se multiplica”, exulta. Tanto pintou e fez que ganhou o título de Cidadã Farturense, em reconhecimento às suas artes em prol da cidade.
De volta à cidade natal, São Paulo, recomeçou. De novo do zero, só que desta vez chegou ao final do túnel. Foi quando aconteceu o fato narrado no início deste texto. “A saúde me deu uma rasteira”, diz a artista. Um problema sério no osso da bacia a coloca em gesso da cintura para baixo por meses. Dor, angústia, imobilização, pouca produção: caos financeiro e emocional.
Logo após aquele emblemático basta, por conseqüência, veio o desafio. “Eu já tinha recebido um prêmio importante em um salão de arte, mas ainda não tinha encontrado a minha essência enquanto artista”, enfatiza Biba. Naquele momento da sua determinação de jamais repetir aquela situação-limite, surge a inspiração. Era como se toda a sua vida tivesse sido apenas um ensaio para que chegasse àquele instante de vida. Da total obscuridade do caos, Biba vislumbrou o lampejo de um pirilampo, que foi crescendo, crescendo, iluminando sua vida e sua arte, até tomá-la por completo.
Encontrou o sentido de sua arte e daí em diante, os acontecimentos se encadearam em uma sequência de ousadia, criatividade e total autenticidade artística e pessoal.
“Hoje pinto o que quero, sem me preocupar se vai vender ou não”, ressalta feliz. Há cinco anos tem o atelier Funilaria e Pintura, um espaço voltado à produção e estudo da arte e educação. Produz pinturas, xilogravuras, desenhos e tudo o que se relaciona ao universo das artes visuais.
Participou de exposições coletivas como Ocupação-Paço das Artes, Paisagens Gráficas, Volumen Cuba e outras. Participou também de mostras individuais como Interior, pela Secretaria do Estado de Cultura e Correspondências, do Circuito SESC de Artes. Também organizou a exposição Armazém-Ocupação com Matrizes. Fez residência artística no Ateliê L’Otroi-Tours, na França e no Taller Experimental de Gráfica de Havana. É constantemente convidada a ilustrar obras de diversas temáticas, em especial, voltadas à arte-educação.
Está sempre à procura de imagens que representem condições e afetos da natureza e do homem. É uma ativista das artes, por isso participa de ações nas cidades, por vezes, com propostas coletivas.
É ainda uma ativista da filosofia, arruma tempo para dedicar-se às atividades da BSGI. Visita seus amigos associados de seu núcleo de bairro, promove encontros, faz palestras, promove estudos da filosofia.
E, além disso tudo, é sócia-fundadora da Casa de Tijolo, um espaço cultural sediado em uma charmosa casinha na Vila Madalena. Daquelas antigas, testemunha de um tempo em que o bairro era simples e tinha um ar do interior. Por fora um personagem congelado no tempo, por dentro um jovem inquieto e subitamente desperto para tudo o que a contemporaneidade das artes visuais pode oferecer. O espaço cultural Casa de Tijolo foi idealizado por Biba, mas hoje é tocado quase que integralmente por sua filha Tarsila, que ainda não se decidiu em que vertente artística vai se firmar. Tarsila transita com desenvoltura e graça pelas artes gráficas, foto, cinema, ilustração. Experimenta e na experimentação, ousa. E ousando vai trilhando passos cada dia mais largos, conforme os versos de seu mestre e mentor, Daisaku Ikeda:
Não faz mal que seja pouco
O que importa é que o avanço de hoje
Seja maior do que o de ontem
Que nossos passos de amanhã,
sejam mais largos do que os de hoje.
A Casa de Tijolo já recebeu artistas residentes da Itália e da Escócia e, desde a sua fundação, tem abrigado em seus cômodos diversas exposições, das mais variadas vertentes das artes visuais. “Queremos criar um movimento artístico que inclua também exposições, mas que não reproduza a lógica cruel das galerias”, explicou Biba à reportagem do site Catraca Livre. “Que possa dar mais que um espaço apenas, possa dar sentido aos jovens artistas, um lugar em que encontrem acolhimento e inspiração!”, finaliza a versátil, ousada e talentosa artista humanista Biba Rigo.
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